Gosto de filmes como Boyhood, do diretor Richard Linklater, que mostram o cotidiano de pessoas
comuns, vivendo seus conflitos e paixões em algum canto do planeta, seja em um
subúrbio ou no coração de uma metrópole. A sensação que fica é a de que a nossa
vida também poderia dar um filme. Sim... Um filme. Por que não? Talvez não um
filme de ação ou aventura, com a jornada do herói bem delineada. Pode ser que
nunca consigamos identificar o verdadeiro clímax da nossa própria história. Mas
ainda assim a nossa vida poderia se tornar um filme. Boyhood é assim. Conta a história de Mason, um garoto comum, filho
de pais divorciados, com uma irmã mais velha e irritante, e uma vida de
instabilidade financeira e familiar. Esse não seria o retrato de grande parte
dos nossos garotos de hoje em dia?
A história começa com Mason aos
cinco anos e acompanha o crescimento e amadurecimento do menino pelos próximos
doze anos. O interessante é que o filme foi produzido literalmente em doze anos
e o elenco é exatamente o mesmo. Dessa forma, o expectador pode ver nitidamente
as mudanças dos personagens, acompanhando a ação do tempo em seus corpos,
personalidades e caráter.
Se pudéssemos registrar doze anos de nossa vida, o que
teríamos como memórias? Diplomas, filhos, relacionamentos construídos,
relacionamentos destruídos, corações partidos, sonhos realizados, sonhos
frustrados, bens materiais adquiridos, dívidas, livros comprados, livros lidos,
quadros pintados, poemas escritos em meio a risos ou lágrimas, letras de
músicas e suas melodias incrustradas em nossa mente, esperando somente os
primeiros acordes para surgirem na ponta da língua. É assim que fazemos nossa
história. É assim que construímos nossa identidade, nosso “eu”. A partir dos momentos.
Não exatamente aqueles momentos de glória, nem os de profunda dor, mas os
pequenos e simples momentos do dia a dia. Francis Schaeffer já dizia que “as
pequenas coisas são profundas e as coisas profundas são surpreendentemente
simples”.
Assim é o filme Boyhood, simples e profundo. Assim é também a nossa vida (bem, da
maioria de nós), simples e profunda. Eu no mundo sou apenas como um virar da
página de um livro. Contudo, para o meu “eu”, não há nada que eu queira mais do
que fazer desse virar de página algo sublime.
Em uma das cenas de que mais gostei
do filme, Mason está se preparando para sair de casa. Ele vai para a Faculdade.
Sua mãe ficará sozinha e por isso decide se desfazer da casa e de grande parte
dos objetos que o imóvel contém. Mãe e filho travam um diálogo a princípio
trivial. Parece mesmo que a mãe dele está tirando de letra o fato de viver
sozinha dali para frente. Mas, de repente, ela desaba em lágrimas. A queixa
dela ainda ecoa em minha mente. A vida passou rápido demais. Outro dia o filho
ainda era um garotinho e agora já é um homem de dezoito anos indo morar fora. O
que será dela dali para frente? O que a vida ainda lhe reserva? Há algo ainda
para acontecer? Era só isso? “Eu pensei que haveria mais”, ela diz.
Não é assim que nos sentimos em
relação há tantas coisas? “Era só isso?”, nos perguntamos. Pensamos que haveria
mais. Isso bem pode ser culpa dos livros e filmes os quais temos como
referência: romances tórridos, beijos de tirar o fôlego, golpes de mestre, uma
virada de mesa no final das contas... Talvez estejamos nos inspirando nos
filmes errados. A vida bem pode ser eletrizante ou assustadora. Mas na maior
parte do tempo, o que a vida é? Monótona, engraçada, repetitiva. Nossa vida é
um filme simples... Simples e profundo.
DADOS SOBRE O FILME:
Boyhood é um filme
norte-americano de 2014, do género drama dirigido por Richard Linklater. O
filme ganhou notoriedade por ter demorado 12 anos para ser concluído, se
tornando uma das mais longas produções da história do cinema.
Escrito por: Ana Faria
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